segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

gitano

querido joaquin,

daqui a uns tempos, quando formos amigos e eu te mostrar o que me fizeste escrever a seguir ao teu último espectáculo, ainda nos vamos rir e tu hás-de-me dizer:
-ora ainda bem que vieste!

as tuas mulheres fundidas como borracha mole ao chão inflexível do pavilhão, misturam-se em tecidos de saias flamencas e cabelos e batons com os novos sons da tua banda. uma espécie de jazz branco que trazes desta vez enrodilhado na voz das cantantes que choram, quais carpideiras, uma dor que não lhes pertence. e depois aquele violino premoniza desgraça e solidão e as tuas mulheres, loucas, choram a tua mãe morta.
tu, agrilhoado a uma cadeira, e uma mulher que esperneia, qual mancha de sangue, no linólio de microfones que captam cada raspar de sola teu.

entras pelo público adentro num delírio sem género porque toda a gente te adora: abraçam-te quando passas, querem prender o teu olhar no teu e que as aches únicas, uma vez na vida. és de todos. deves-nos isso.

"era uma vez um menino que sonhava voar..." pois, não se ouve o que dizes a seguir porque a histeria sobrepõe-se ao racional. até gostava de saber o que ías contar. pediste silêncio ao público um sem número de vezes e senti a bancada ceder outras tantas, ao bater de pés em tua homenagem.

os solos sincronizados com a percussão e o trompete e o saxofone foram milimétricos e explodi muito à tua custa.

és feito de fogo e o chão que danças é incandescente à tua passagem. a guitarra é dedilhada como uma harpa fosse e eu vejo-me entrar no teu sonho de viagens e voltas ao mundo.

e alguém ao meu lado grita:

- no quites los tacones, nunca!


1.39/6Dec/no seguimento

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