quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

beijo-bicho

procurou-a por entre os grandes contentores de chapa bruta. aflitíssima por não a encontrar. pediu ajuda aos segurança do cais, mas nenhum auxílio foi frutífero. chorou o seu nome em uivos de dor mas, empurrados no ar pelo vento cinzento, perderam-se para sempre.

quando por fim chegou a casa, eis o que o bilhete preso pelo íman do frigorifico lhe reservava:

"corria por entre pessoas e animais e só parava quando sentia no ar símiles do teu cheiro. vivia com os olhos no telemóvel esperando uma mensagem tua, um telefonema, qualquer coisa. tinhas-me cativo pelo teu cabelo, pelos teus pés e pelos teus dedos que adorava chupar lentamente e de olhos fechados. os teus beijos...ah, os teus beijos... essa forma que tu tinhas de me despedaçar o coração assim, em três tempos, sem mais nem porquê. beijo-bicho. animal selvagem, cheio de veneno que me entorpecia os membros e me deixava literalmente sem força anímica, enquanto tu te ias aproveitando da minha desgraça e eu desmaiava á tua frente. mais do que a ti, amava os teus beijos e o que eles me faziam. é possível viver de amar os teus beijos. eu não me importava com o que as pessoas diziam de mim: chamavam-me idiota e banana por seres a minha número um, a minha predilecta de entre todas e por causa do teu desprezo para com o meu fascínio por ti. a forma cruel com que tu me magoavas desnecessariamente e o despeito com que tratavas todas as minhas investidas. mas eu nunca me importei: eram os teu beijos o que eu queria. esse embrião de bicho raro com que fecundaste o dorso da minha língua magoada e que precisava da tua saliva para se desenvolver.

trata bem da Vitória. faz um esforço para te lembrares de lhe deitar água todos os dias e leva sempre a trela contigo.

para sempre, teu
Salvador "


20h28/30 dec/num sítio que não é o meu

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